Longe vão os tempos em que o padre, o professor e o regedor eram as figuras mais conceituadas e respeitadas das freguesias rurais a que acresciam, no âmbito concelhio, o médico e o presidente da Câmara.
Havia legislação que obrigava os professores a residirem no local de trabalho, enquanto os padres viviam no passal paroquial, normalmente, edifício doado por paroquiano devoto, ou adquirido com o contributo dos fiéis.
No atual código do direito canónico, determina-se que “o pároco está obrigado a residir na casa paroquial junto à igreja”(can 533), sinal de que a Igreja atribui grande importância à proximidade do sacerdote junto aos paroquianos.
Nas últimas décadas, porém, por alegada falta de clero, ou influência das congregações religiosas, implementou-se os párocos “in solidum”, designação canónica que atribui a um ou mais sacerdotes um grupo de paróquias, aos quais é atribuída, por igual, a missão pastoral. Esta solução, deixou de fora as paróquias de Ponta Delgada e Angra; ali mantem-se a figura do pároco, por vezes coadjuvado por outros sacerdotes. Nas zonas rurais e em agregados urbanos de menor dimensão, como na Horta e Capelas, os párocos não têm paróquia definida: são nomeados para várias, sem jurisdição numa em concreto, o que não traz benefícios para aquelas comunidades. Este entendimento dos fiéis faz com que, ao domingo se interroguem: qual é o padre que vem hoje?
As paróquias perderam população, a sociedade secularizou-se, o número de fiéis praticantes, em todas as idades, é cada vez menor.
O pároco já não tem a preponderância que tinha na educação humana e cristã, na construção e afirmação da comunidade, da identidade e do sentido de pertença. Esse papel passou a ser desempenhado sobretudo pela escola e por outras instituições sócio-culturais.
A ausência e o distanciamento dos párocos “in solidum”, residindo longe das comunidades, impede-os, habitualmente, de estarem e partilharem com elas o dia-a-dia do trabalho e do lazer. O seu munus pastoral restringe-se às celebrações litúrgicas semanais e a pouco mais.
E o povo cristão sente-se com isso.
Segundo o Concílio Vaticano II, “o múnus de pais e mestres” compete aos sacerdotes que “devem estar à frente de tal modo que, não procurando os próprios interesses mas os de Jesus Cristo, trabalhem na obra comum com os leigos e vivam no meio deles segundo o exemplo do Mestre, que «veio» para o meio dos homens, «não para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de muitos» (Mt. 20,28). E acrescenta: “São os defensores do bem comum do qual têm cuidado em nome do Bispo, e, simultâneamente, reivindicadores da verdade para que os fiéis não se deixem enredar por qualquer doutrina. São-lhes confiados com peculiar solicitude os que se afastaram da prática dos sacramentos e sobretudo da fé, dos quais, como bons pastores, não deixarão de se aproximar.” (PO nº9)
Esta missão não se exerce só nas celebrações litúrgicas de horários habitualmente incertos, ou em apressadas conversas de sacristia, entre missas dominicais. Precisa de tempo, de diálogo, de estudo, de viver com.
A continuar assim, está-se a transformar a Igreja num supermercado de sacramentos pois não se fomenta, convenientemente, nem a vida espiritual, nem o apostolado nem o surgimento de iniciativas que “por meio do diálogo contínuo com os leigos” respondam às suas atividades apostólicas e favoreçam as suas iniciativas.(A.A.nº25)
Nos últimos dias, algumas comunidades foram informadas das anuais transferências do clero, sem que tivesse havido qualquer auscultação dos leigos ou seus representantes diocesanos.
É um procedimento autocrático, baseado no voto de obediência do clero, que não prestigia nem a autoridade do Bispo pois não envolve os fiéis na missão pastoral, nem os sacerdotes, com a missão de evangelizar comunidades tão distintas consoante as ilhas, as localidades rurais e urbanas e os estratos sociais que lhes são confiados.
Do modo como são conduzidas, as transferências do clero assemelham-se a colocações de funcionários públicos e à mera gestão de pessoal indiferenciado.
Por isso, é cada vez mais evidente o desinteresse dos fiéis pelos párocos, e menos apreciado o seu ministério sacerdotal.
Não há dúvida de que o Sr. Padre...morreu.
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